Mãe com minha mãe.

Eu engravidei. E a perspectiva da maternidade trouxe a tona a única mãe que eu sabia ser: a minha. Em uma breve fresta que se abre no espaço e tempo, eu permiti que ela entrasse e me dissesse que era hora de crescer. Que não era possível ser mãe sem dinheiro, sem estabilidade, sem um apartamento e sem sacrifício. Ela me disse que para ser mãe eu teria que abrir mão de tudo que me fazia feliz. Eu deveria parar de viajar, parar de ser tão alternativa, parar de dançar, de transar, de amar e também de sonhar. Que se eu queria mesmo ser mãe, eu deveria pelo resto da minha vida me tornar escrava do dinheiro.

Eu acabei perdendo o bebê mas segui grávida das palavras de minha mãe. Saí do bunker anarquista off the grid onde eu morava no meio da floresta africana e voltei pro Brasil. E, aos poucos, fui me vendendo por dinheiro, por um apartamento, por uma estabilidade financeira que pague o seguro saúde, as contas de luz e gás e me preparando para ser mãe como minha mãe foi.

Comecei a sofrer roubos. Roubos das minhas partes que não ia mais precisar, já que eu quero ser mãe. Fui sendo arrancada de tudo aquilo que uma mãe “direita” não pode ter dentro de si. Desejo, sexualidade, risada alta, espontaneidade, liberdade, deboche, beleza interior…

E fui me entregando sem perceber um esvaziamento de tudo aquilo que me faz eu. Me vendendo pouco a pouco pro sistema. Admito: por um triz não voto 13. Fui me abandonando, esquecendo de cuidar de mim. Me tornando essa mãe que dá tudo de si pros outros em troco de um conforto e de uma segurança.

Me apeguei a um trabalho que não amo. Me apeguei a uma ideia do que significa ser adulta. Me apeguei a compras online, cigarros e pão de queijo como válvula de escape. Me apeguei ao tédio. Meu orgasmo já não é mais o que era antigamente. Minha coragem parece ter sumido. Minha alegria, nem me lembro mais.

Como uma alma que atrofia, fui perdendo a cor. Vivendo uma vida vazia de sentido, vazia de amor, vazia de magia. E cheia de dinheiro. O tempo está passando e eu quero ser mãe.

É disso que o mundo precisa? Mais uma mãe infeliz no mundo!

Mas a evolução espiritual não é algo que se pode frear. Por dentro algo se expandia. Por dentro algo inventava formas de gritar, de fazer escândalo e de dizer não! Eu achava que o não era pro desrespeito mas agora entendo que o verdadeiro não é pra ser mãe como minha mãe foi.

É uma coisa ser uma mochileira aos 20 e poucos anos. É algo totalmente diferente olhar na cara da sociedade aos 35 e dizer NÃO. Eu não vou mais viver assim. Eu não vou me vender pelo dinheiro. Eu não vou mas ficar calada sentada aqui sem dançar pra te agradar. É uma coisa muito diferente olhar para uma mochila aos 20 e depois aos 35. O relógio da maternindade fazendo tictac.

Mas eu estou olhando.

Chega uma hora que o que está dentro pede alinhamento com o que está fora. Que não se pode mais fingir. Que não há mais como guardar segredos. Que se eu acredito mesmo no que se passa dentro de mim então eu preciso viver isso no externo também.

E eu acredito MESMO.

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