Cheguei ontem em Lima para colaborar com a Casa de Convergência TIERRACTIVA que, em um nível energético, é a Jungle House da COP20, Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas. Essa casa é um espaço de convivência autônomo temporário que pretende trazer para o local da negociação outras formas de se organizar e soluções alternativas para a crise ambiental. Soluções que passam pela cura interna, pela conexão com a natureza e recuperação do animal humano que está adormecido no meio de tanto conforto dentro de nós além das propostas políticas alternativas da auto-gestão, horizontalidade, vida em comunidade, consumo consciente, alimentação sustentável, moedas solidárias (com especial atenção para o crescente BitCoin, a moeda virtual), comunicação livre e outras tantas iniciativas que pipocam por la calle que, encontram na casa o espaço para convergir e, quem sabe, ganhar alguns corações desse torpor dessa luta política institucional que só canaliza energia pra frustração e não dá em nada.
Comecei o dia varrendo o telhado onde estarei acampando e acabei criando uma intenção para essa limpeza, decidi que estava limpando a poeira do movimento ambientalista e a minha própria poeira interna com esse movimento que tanto me decepcionou no passado. Foi bem difícil viu… Me senti limpando uma praia de tanta poeira acumulada. A casa estava fechada há muito tempo. Após 2 horas varrendo intensamente, percebi que a poeira pode levar algum tempo para se limpar. E que vamos acompanhando essa limpeza ao longo dos dias… Será que eu conseguirei limpar toda mágoa, toda decepção, toda desconfiança do outro nesse processo? Saberemos…
Enquanto eu varria, refletindo sobre o movimento, coisa que não fazia há um bom tempo, tive uma realização que vai arrepiar alguns cabelos por aí. A esquerda socialista, comunista, seilaoqueista, vem tomando o discurso ambientalista como seu novo palco. O ecosocialismo é o discurso através da qual a esquerda vem se reerguendo e dando mais visibilidade para as ideias anacrônicas que defende. (Não me acusem de direitista, antes ideias anacrônicas do que ideias demoníacas que limitam toda potência do ser humano pelo lucro) Mas, sabe, hoje percebi que estes dois discursos não podem se juntar, não se pode trazer o método das lutas para o movimento climático como está sendo feito há anos. Porque a natureza não fala essa língua do ranço, da luta, do ego, da injustiça e nem da igualdade. A natureza produz singularidades, não existe uma árvores igual a outra, nem um ser é igual ao outro, nenhum homem é igual ao outro. Um mundo em que todos fossem iguais seria o mundo mais chato de todos os tempos! A natureza também não está em luta, não tem ranço, não tem logo, não tem instituição… A natureza está em festa! Os pássaros cantam. Os seres se reproduzem. Essa é a essência da natureza. Claro que ela está sendo devastada mas alguém a viu protestando? Esse momento VAI chegar quando ela atingir seu limite de sobrevivência mas até lá, ela segue dando amor, segue doando, segue sendo a grande mãe. O que nós fazemos com ela não é amoroso mas ela continua nos amando, nos alimentando…
O verdadeiro movimento ambientalista é um movimento essencialmente feliz, amoroso e sutil. Ele é um movimento sem nome. A natureza é sempre “a natureza” e isso a define em toda sua grandiosidade. O movimento dela tem que ser parte dela, parte da natureza. Não é mais uma organização, mais um logo, mais um projeto, mais uma redução de danos. E como esse movimento pode ser criado? Ele já existe, ele está dentro de cada um de nós, escondido dentro do nosso lado que se identifica como parte da natureza, ele está em nosso animal. Precisamos recuperar nosso lado selvagem, tribal, ancestral. Precisamos voltar a ser bicho. Uma onça não é um bicho incrível? Um lobo? Uma águia? Uma baleia? Não são incríveis? Nós somos o bicho com mais capacidade de ser incrível, se deixarmos de viver para a nossa mente. Nos tornamos tão intelectualizados que nossa vida se resume ao que conseguimos pensar. Um animal não tem mente, ele é puro instinto. Nós temos isso dentro de nós e, como bônus, temos a mente. Precisamos deixar de ser o bônus.
Para salvar a natureza, precisamos pensar como ela. Lembrar dela constantemente. Não nos separar dela. Ela tem que fazer parte do nosso ser. Precisamos agradecer a comida. Reverenciar o sol e a lua. Trocar olhares comunicadores com cachorros e cavalos. Sentir. Descansar. Desconectar. E à partir deste novo estado mental, buscar soluções. Antes de restabelecer essa conexão com aquilo que nos move, como podemos acertar nos nossos movimentos?
Como unir as diversas iniciativas, projetos, logos e estratégias? Temos que nos unir na nossa humanidade, no nosso interno. O que nos une é uma meditação que fazemos pela manha. É um olhar apaixonado para uma flor que reconhecemos no outro. É uma rapidez de reflexo peculiar resultado do treinamento físico através do pranayama. É a flexibilidade e calma corporal da Yoga. Nos tornamos uma nova humanidade, criamos novos tipos de humanos: os terráqueos. Homens-animais. E uma vez neste novo estado humano resultado da vontade e disciplina, percebemos que vivemos em dois mundos. E que já não dialogamos com os que estão no estado mental do passado. É impossível.
Precisamos espiritualizar o movimento ambientalista. É isso.
Parece que limpeza começou. Voltei a sentir.