Eu sabia!
“Estou apaixonada pelo Black Bloc” disse uma amiga ativista que muito respeito em mais uma dessas mesas de bar. Há meses que tenho tentado digerir essa tática tão defendida por quem está nas ruas. Fico sempre ouvindo, tentando entender o porquê de não conseguir ver solução, sequer CAMINHO de mudança vinda dessa galera. Fiz de tudo, conversei com o máximo de pessoas que eu pude, até pra São Paulo encontrar os amigos reformistas-políticas-públicas-conferências-conselhos eu fui. TODOS me afirmavam que o Black Bloc é legítimo enquanto expressão de revolta do povo, que é resultado de anos de exploração da classe dominante, que representa a autonomia de uma classe C emergente que vem se livrando das amarras da fome, que é resultado da traição do Partido dos Trabalhados que deixou as massas perdidas, que promove o debate sobre a violência policial, que renova as energias dos jovens ativistas, já ouvi de tudo!
Fui me deixando convencer e tentando julgar menos o que eu via com meus próprios olhos nos atos que participava. Olhava ao meu redor na presença do Black Bloc e não conseguia ver a politização ali, só via jovens perdidos querendo chamar atenção. Os anarcopunks de cabelo roxo, calça rasgadas propositalmente, botinas de guerra sujas segurando suas bandeiras e escudos, cantando “poder para o povo” em nome de um povo que ali não se encontrava. Eram os justiceiros, portadores de todo o bem ou, pelo menos, é o que pareciam acreditar. Super heróis alucinados lutando contra o “estado dominante” na escadaria da Câmara dos Vereadores.
Aos poucos fui deixando de ir pra rua. Eu realmente não me encaixo com aquelas pessoas que me davam medo e me olhavam com desdém. A tal auto proclamada vanguarda. Mas segui apoiando… Todo mundo tá apoiando, né?
Me lembro que um dia postei no Facebook o título desse post: “O Black Bloc tem que parar”. Fui massacrada pelos comentários me xingando de coxinha, de alienada. Fui realmente humilhada na minha própria feed por expressar o que meu coração sentia. Foi um pouco depois disso que comecei a aceitar e esperar pra ver no que vai dar. Me deixei convencer pela maioria.
E taí. Deu no que deu. Semana passada morreu um cinegrafista da Band que tem uma cara tão simpática, tadinho. O cara levou uma bomba caseira na cabeça vinda de um manifestante desses que acha que é a vanguarda da resistência. Parou o mundo, só se fala nisso, inicia-se mais uma guerra contra a Globo que aproveita o caso para proliferar mais medo entre a população que vem cada vez mais apoiando a punição dos “vândalos” e o Estado rapidamente usa disso como desculpa para aprovar uma lei que enquadra manifestantes como terroristas e praticamente impossibilita manifestações. Aos poucos somos nós que vamos dando as brechas para que a ditadura seja implantada oficialmente com apoio da opinião pública.
É tamanha burrice jamais vista. Ninguém mais vai pras ruas, as reuniões e assembleias viraram uma constante análise dos acontecimentos semanais e tentativas frustradas de fazer eventos de formação, manifestações criativas e vídeos virais para tentar explicar pra população o outro lado da história. Fazer a “contra-informação” como se meia dúzia de coletivos fossem esclarecer alguma coisa dita pela Globo no Fantástico! De nada adianta já que já estamos censurados pelo Facebook mesmo e acabamos falando entre nós as mesmas coisas para nós mesmos. (Achando que isso é ativismo e esse é o caminho da revolução.)
Enquanto isso planos de fato revolucionários, de mudança radical baseados em estratégias que divergem dos fundamentados no sistema atual como a não-violência, compra coletiva de terrenos para viver em comunidades, boicotes, arte de rua, terrorismo poético, rodas de conversa pra crianças, queima de todo o dinheiro, ações criativas simultâneas e extremamente organizadas são deixados de lado. São esquecidos porque dá muito trabalho. A galera quer adrenalina na rua, quer se sentir importante e macho (inclusive as mulheres) mas não quer chegar na hora em uma reunião ou entrar em conflito de ideias em uma assembleia buscando verdadeiramente o consenso.
A verdade é que ninguém leva mais nada a sério. Vai todo mundo levando tudo nas coxas, dando os jeitinhos, passando por cima de detalhes, se ocupando demais pra refletir sobre o mundo ou sobre a vida. E depois vai geral tomar uma cerveja.
Eu tô fora cara. Pode me chamar de coxinha, patricinha, covarde. Me recuso a participar dessa ilusão coletiva. Desse entretenimento barato disfarçado de política. Eu não preciso fazer mais novos amigos. Eu quero mudança e não acho que isso seja possível no Brasil hoje. Eu vou promover a mudança dentro de mim, me espiritualizar e encontrar a minha paz interior. Não vale a pena dessa maneira.
E deixo os meus mais sinceros votos de que o Black Bloc pare antes que seja tarde. Ou que alguém me apresente um plano que faça sentido.
(Esse post reflete o inconsciente coletivo fluindo através de mim. É minha opinião hoje que pode mudar amanha.)